quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

- Agostinho da Silva



Agostinho da Silva

"Que todo o mundo seja «Portugal», isto é, que no mundo toda a gente se comporte como têm comportado os portugueses na história" "Primeiro inventaram o país que queriam, porque não havia. Quem olhava para o mapa da península nunca via desenhado nele Portugal. Havia províncias romanas, havia mais domínios mouros, havia umas coisas esquisitas que sobravam lá de muito atrás como o país dos bascos, etc...

Mas, foram os portugueses que viram, nitidamente, o país desenhado no mapa da península, e depois lhe traçaram os limites. E que aconteceu? Aconteceu que realizaram o único país estável do mundo. Todos os outros têm mudado, todo o jogo de fronteiras tem sido no mundo, excepto para Portugal.

E foram para o mar. E que Mar resultou das viagens dos portugueses? O Mar que há. O Mar que toda a gente teve que aceitar. Não havia outro possível" "Se essa é a missão que Portugal tem que realizar no mundo, porquê agitar-se muito? Deixa andar, é como quando nós confiamos uma tarefa a uma máquina, confiança absoluta que ela vai preparar o nosso almoço quando se carregou num botão a um tanto minuto, e depois o que há a fazer? Agitar-se? Nada disso, esperar que a máquina acabe a sua tarefa: pode ser que a máquina do mundo tenha uma determinada tarefa para Portugal.

Então não me agita nada que os portugueses sejam passivos. Nunca foram na história. É uma ideia curiosa essa que aparece muito hoje em dia de que os portugueses são passivos: eles estão à espera de que o barco passe para pularem dentro" "Portugal fez coisas que nenhum outro país fez. E portanto, se foi capaz de desempenhar missões, de realizar aquilo que outros países não realizaram, então talvez, quem sabe, possa ele no futuro realizar as tais missões que hoje parecem utópicas, mas que porventura, nenhuma outra nação do Mundo seria capaz de realizar como ele" "São Bernardo disse aos templários: «para que vocês deixem de combater os muçulmanos, o melhor é comerciar com eles», (...) a coisa é que saiu mal, (...)o que acabaria por tornar os templários em banqueiros (...), o que fez Dom Dinis também, que fez uma coisa muito interessante que foi a primeira nacionalização que houve em Portugal, nacionalizando o tesouro dos templários, fazendo ao mesmo tempo, a primeira privatização, já que os privou a eles de terem o tesouro, toda a nacionalização pode ser uma privatização ao mesmo tempo, não é?"

"Não tenho saudades, as pessoas de quem eu gosto estão sempre comigo, como vou ter saudades deles? Mesmo que seja muita a distância. De modo que essa coisa de Saudade para mim não existe, sempre tenho andado no mundo, Brasil por exemplo, não tive saudades de Portugal, nem agora tenho do Brasil. A Saudade supõe ausência, se eu nunca estou ausente de mim, como vou ter Saudades?"

"Os portugueses são facilmente vuneráveis aquilo que sucede no mundo, facilmente pessimistas, e às vezes eles estão tocando o pessimismo como quem toca guitarra, para se entreterem. Vão dizendo: «se amanhã estivermos vivos»; «se lá chegarmos»; «oxalá possamos chegar»; etc.... Como se tivessem dando à vida, que é monótona para eles, um tempero excitante de poderem não estar vivos daí uns minutos. Temos que amar cada vez mais a vida e a ter cada vez mais ampla, e fazermos tudo na nossa pequena área ou na nossa área maior para que ela assim seja, para ver se as pessoas se despem desse pessimismo. Se andando vivos na vida, ao passo que a maior parte da gente faz de morto para que a vida não o agrida a ele, andando vivos na vida chegamos a ter um entusiasmo comunicativo a nós próprios sempre, e contagioso para todos aqueles que connosco lidarem"

"O Império Romano ter nascido como nasceu, e se ter estendido até onde se estendeu, e de repente encontrar um muro tremendo, o muro líquido do Atlântico, que impedia a sua expansão ao resto do globo. Esse muro do Atlântico que travou o Império Romano, quem o foi derrubar? Foi um pequeno povo, quase esquecido, no Ocidente da Península que conseguiu que o muro se derrubasse e que o Império Romano, já com outras características, se estendesse efectivamente a todo o mundo."

"Temos que dar qualquer jeito para que Portugal deixe de coxear e realmente se reinstale. Eu acho que o problema que está hoje diante de Portugal é de se reinstalar, de se restaurar (...) de voltar aquilo que os portugueses acharam que era o seu próprio Portugal"

"Vamos dar ao mundo aquilo que temos de melhor, que é de sonharmos continuamente, e de ao mesmo tempo, termos um conceito objectivo da vida(...)ver o mundo tal qual ele é, e ao mesmo tempo descobrirmos nisso o que ele também é, mas muitas vezes oculto aos outros" "Não se trata disso, de dizer que Portugal tem como destino o Quinto Império. Portugal inventou, imaginou isso do "Quinto Império" e nós temos que o examinar e ver o que pensou Vieira e ver se isso não está dentro de nós e da nossa capacidade."

"Esse Quinto Império tem sido muito mal interpretado em toda a parte. Temos que examinar se esse Quinto Império e quando digo nossa não digo a daquele Portugal que vai entre o Minho e a Ilha do Corvo. É daquela gente que foi tocada por esta pintura, com que se apresentam formas várias, por toda a parte."

"A questão portuguesa, não é de se falar uma palavra de português. É de ser, ou não, à maneira portuguesa de ser. É ser variadissimas coisas ao mesmo tempo e por vezes coisas que parecem contraditórias. E possibilidade de encarar um tema e de o encarar de várias maneiras, conforma a época em que viveram, a linguagem que utilizavam, a maneira que se sentiam na vida. Quando se fala agora em Quinto Império, toda a gente se esquece que a primeira ideia de Quinto Império apareceu com o Camões, nos Lusíadas, na Ilha dos Amores. O que é que o Camões põe como o fim da actividade humana? Na primeira parte de Os Lusíadas, ele, o que conta é como os portugueses realizaram esse projecto extraordinário que foi desde o começo, de uma agitação portuguesa lá pelo lado de Gaia até ao Vasco da Gama. Terminada uma empresa, em que cada um teve que cumprir um dever, de ser isto ou aquilo como trabalhador, terminada essa empresa aparece aquilo de cada Homem ser aquilo que realmente é. Ser ao máximo, plenamente, aquilo para que nasceu e que marca a sua indivualidade. Assim que aqueles marinheiros que estiveram em Calicute tocam aquela Ilha, eles são aquilo que eram."

"O Futebol, o Jogo dos Bancos, dos políticos que não se entendem entre si, em lugar de se ajudarem uns aos outros nessa tarefa difícil que é administrar um País, em que se tem que ao mesmo tempo de olhar o presente e ter a maior confiança no que se pode fazer ao Futuro." "Se isto foi uma discussão, foi uma coisa boa, no sentido etimológico da palavra, que é sacudir. Já que abanar as cabeças é bom, para saber se existe dentro delas alguma coisa."

"Eu suponho que sou uma pessoa de convicção. Se a convicção é a mesma coisa que a fé é algo discutível. A convicção é alguma coisa que a pessoa traz ou sente que traz dentro, como se fizesse bem parte dele, e que não há maneira de evitar. O convicto não evita. Quanto à fé, é outra coisa. É em geral aquilo em que se acredita, o que se convence a pessoa de que existe, sem ter nenhuma matemática pelo meio, sem haver nenhuma equação que o prove. A pessoa então tem fé." "A igreja mais bem pensante seria aquela que as pensasse todas juntas. E que desse, como um resumo geral, sem coibir em nada, sem prender em nada, as integrasse todas num todo. Até agora ainda não apareceu."

"A obrigação do homem é voar alto, mas sem nunca perder a linha de terra. Temos que ter as duas coisas ao mesmo tempo. Ter o chão em baixo, tão objectivo e tão nítido como se fosse um mapa em relevo. E ao mesmo tempo voarmos alto. Uma só das coisas não é humana. Seria de um bicho só adaptado ao chão ou d'outro lado, adaptado ao céu."

"Conheço uma porção de gente que andava com uma ideia, uma ilusão a respeito do que lhe estava sucedendo na vida, de súbito as coisas mudam, e a pessoa fica completamente desorientada, sem parar sequer um momento para ver se ela não é uma «pedra» que está recusando o cinzelo do escultor que a quer tornar menos pedra e mais estátua. Então é preciso que a pessoa numa altura dessas: pense bem; esteja calmo; deixe suceder mais um tempo; veja o que lhe vai aparecendo e depois reflicta realmente se não avançou com aquilo que lhe parecia negativo.

Porque afinal, é com o esforço de subir um degrau que a pessoa chega ao patamar. Talvez a vida nos ponha degraus bastante fortes, para nós darmos boas passadas, exercitarmos bem os nossos músculos, e chegarmos aos patamares mais altos que há. "É extremamente simples viver. Desde que a pessoa, para viver como vive, tenha o suficiente para comprar as coisas. Porque nós estamos nessa contradição. Nascer de graça e passar o resto da vida a ganhá-la. O que é inteiramente absurdo. Desde que nascemos de graça, a vida devia continuar a ser de graça."

"Diante daquilo que se ama, não se deve ser crítico, deve-se deixar que o amor nos possua. Mas diante daquilo que se admira deve-se estar sempre com a objecção pronta, para se poder demolir aquilo que admiramos que afinal pode apenas nos estar iludindo." "Nenhuma pessoa tem qualidades ou defeitos. Uma pessoa tem características. Quando nos agradam, chamamos-lhes qualidades, quando não, chamamos-lhes defeitos".

"Eu costumo sempre citar, a propósito da construção do Brasil, como o português, durante 250 anos foi o mais manhoso de sempre, mentiu sempre com mapas falsos para toda a parte para se conseguir o Brasil que se tem hoje. Foi um defeito ou uma qualidade? Ter aquele pais e levá-lo a um ponto onde se poderia desenvolver, foi um defeito ou uma qualidade?

Quando o português mandava embaixadores pela Europa a ver se era possível comprar relógios que pudessem medir a Longitude era uma qualidade ou um defeito? Era qualidade, mas a um tempo era um defeito, porque esses europeus ainda não sabiam medir bem a longitude e podiam ser enganados".

"É preciso que tenhamos certezas na vida, mas também que um grande número de dúvidas nos acompanhe."

1 comentários:

Anónimo disse...

Grande texto meu caro Gonçalo...

Força nisso, vamos mudar Portugal juntos e fazer deste pedaço de terra que amamos um lugar ainda melhor para todos os quantos amam e habitam nele.