terça-feira, 17 de março de 2009

5* - Portugal e o turbilhão espanhol

A política espanhola modificou-se logo no ano seguinte com a assinatura do Tratado de Santo Ildefonso com a França, em 18 de Agosto de 1796. O acordo que só tinha efeito contra a Grã-Bretanha, como especificava o seu artigo 18, punha em prática o que tinha sido defendido em 1790 por Mirabeau: uma aliança ente as duas Nações, para além dos respectivos regimes. A ideia baseava-se no facto de se achar, dos dois lados da fronteira, mas sobretudo do lado francês, que os dois países eram aliados naturais, e os seus interesses económicos e militares complementares.


Para Portugal o artigo 4 do Tratado era muito interessante, já que a França revolucionária aceitava a existência do estatuto de potência auxiliar. Do ponto de vista formal, as posições de Luís Pinto de Sousa estavam a partir de agora acauteladas. Conseguir que a República aceitasse esse estatuto para a participação de Portugal na coligação era evidentemente o mais difícil. Havia aqui uma contradição que só podia ser resolvida pela França. Portugal tinha entrado na coligação defendendo o seu estatuto de potência auxiliar, e por isso sem pôr em causa o seu estatuto de neutralidade. A França aceitava a existência desse estatuto, mas não o aceitava no caso da participação portuguesa. Ora era exactamente para prevenir a eventualidade - melhor seria dizer a probabilidade - de a França, na guerra europeia que se avizinhava em 1793, não acatar a neutralidade portuguesa, que Portugal tinha sentido a necessidade de se aliar à Grã-Bretanha e à Espanha, e colocar o seu comércio marítimo sob a protecção das duas forças navais aliadas.


Mas para as potências contratantes, a França e a Espanha, os objectivos imediatos eram bem diferentes. À França interessava-lhe o apoio da frota espanhola e a possibilidade de utilização dos Portos atlânticos da Espanha na guerra marítima contra a Grã-Bretanha. A Espanha estava somente interessada em Itália, já que na frente marítima o apoio francês seria sempre mínimo, como de facto sempre o foi até 1808, e a guerra marítima contrária aos interesses económicos e financeiros da Espanha naquele momento. De facto não parecem ser os interesses da Espanha o que estava em causa na assinatura da aliança ofensiva e defensiva contra o Reino Unido, mas sim os interesses dinásticos, centrados pelo casal real Carlos IV e Maria Luísa da Parma, com o apoio explícito de Manuel Godoy, na península itálica.


E a realidade política italiana estava a ser transformada de uma maneira totalmente inesperada, no segundo trimestre de 1796, pelo jovem general Bonaparte. O exército francês de Itália tinha tomado a iniciativa militar a partir de Abril, invadido o Piemonte, o território continental do Reino da Sardenha, e derrotado o seu exército, tendo ocupado de seguida Parma e Modena assim como a Toscânia, tomado algumas fortalezas da República de Veneza, invadido os Estados da Igreja e obrigado o reino de Nápoles a negociar a sua retirada da coligação anti-francesa. Em 23 de Junho, data do tratado de paz com o Papa, a Itália estava pacificada e ocupada pelo exército francês, sendo que a Espanha não tinha sido solicitada a intervir como mediadora em nenhuma destes acordos. Nem tão-pouco foi notificada quando foi negociado o tratado de paz de Outubro de 1796 entre Nápoles e a França, que teve como consequência a retirada da frota britânica do Mediterrâneo.

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