quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

- Constituição portuguesa de 1822

A Constituição Política da Monarquia Portuguesa, aprovada em 23 de Setembro de 1822 é a primeira lei fundamental Portuguesa, o primeiro documento constitucional da História do país, o qual marca uma tentativa de pôr fim ao absolutismo e inaugura em Portugal uma monarquia constitucional.

É resultado dos trabalhos das Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa de 1821-1822, eleitas pelo conjunto da Nação Portuguesa - a primeira experiência parlamentar em Portugal, nascida na sequência da revolução liberal de 24 de Agosto de 1820, no Porto. As Cortes Constituintes, cuja função principal, como o próprio nome indica, é elaborar uma Constituição, iniciaram as sessões em Janeiro de 1821 e deram os seus trabalhos por encerrados após o juramento solene da Constituição pelo rei João VI de Portugal em Outobro de 1822 (o qual, no entanto, foi recusado pela rainha Carlota Joaquina, e por outras figuras contra-revolucionárias de grande nomeada, como o Cardeal-Patriarca de Lisboa, Carlos da Cunha e Menezes).

Definida como sendo bastante progressista para a época, inspirou-se, numa ampla parte, no modelo da Constituição Espanhola de Cádis, datada de 1812, bem como nas Constituições Francesas de 1791, 1793 e 1795, sendo marcante pelo seu espírito amplamente liberal, tendo ab-rogado inúmeros velhos privilégios feudais, característicos do regime absolutista. Estava dividida em seis títulos e 240 artigos, tendo por princípios fundamentais os seguintes:


  • a consagração dos direitos e deveres individuais de todos os cidadãos Portugueses (dando primazia aos direitos humanos, nomeadamente, a garantia da liberdade, da igualdade perante a lei, da segurança, e da propriedade);
  • a consagração da Nação (união de todos os Portugueses) como base da soberania nacional, a ser exercida pelos representantes da mesma legalmente eleitos - isto é, pelas Cortes, nas quais reside a soberania de facto e de jure, já que os seus elementos têm a legitimidade do voto dos cidadãos;
  • a definição do território da mesma Nação (Continente, Ilhas Adjacentes, Reino do Brasil e Colónias na África, Ásia e Oceania);
  • o não reconhecimento de qualquer prerrogativa ao clero e à nobreza;
  • a independência dos três poderes políticos separados (legislativo, executivo e judicial), o que contrariava os princípios básicos do absolutismo que concentrava os três poderes na figura do rei);
  • a existência de Cortes eleitas pela Nação, responsáveis pela actividade legislativa do país;
  • a supremacia do poder legislativo das Cortes sobre os demais poderes;
  • a emanação da autoridade régia a partir da Nação;
  • a existência, como forma de Governo, de uma Monarquia Constitucional com os poderes do Rei reduzidos;
  • a União Real com o Reino do Brasil;
  • a ausência de liberdade religiosa (a Religião Católica era a única religião da Nação Portuguesa).

O poder legislativo passou a ser da competência das Cortes, assembleia unicameral que elaborava as leis, e cujos deputados eram eleitos de dois em dois anos pela Nação. A preponderância do poder legislativo sobre o poder executivo é uma característica dos regimes demo-liberais mais progressistas, por oposição às chamadas Cartas Constitucionais, de cariz aristocrático e outorgadaas pelo Rei.

O poder executivo era exercido pelo Rei, competindo-lhe a chefia do Governo, a execução das leis e a nomeação e demissão dos funcionários do Estado. No entanto, o Rei tinha apenas veto suspensivo sobre as Cortes, podendo suspender a promulgação das leis de que discordava, mas sendo obrigado a promulgá-las desde que as Cortes assim o voltassem a deliberar. Não lhe era concedido o poder de suspender ou dissolver as Cortes.

Em ocasiões especiais, o Rei era aconselhado pelo Conselho de Estado, cujos membros eram eleitos pelas Cortes, e coadjuvado pelos secretários de Estado, directamente responsáveis pelos actos do Governo. Apesar de tudo, a sua pessoa era considerada inviolável.

O poder judicial pertencia, exclusivamente, aos juízes, que o exerciam nos Tribunais.

Quanto ao corpo eleitoral, e de acordo com o artigo 34.º da Constituição, podiam votar, para eleger os representantes da Nação (deputados), os varões maiores de 25 anos que soubessem ler e escrever. Tratava-se, pois, de um sufrágio universal e directo, de que, no entanto, estavam excluídos as mulheres, os analfabetos, os frades e os criados de servir, entre outros.

Com a aprovação desta Constituição tem início em Portugal a Monarquia Constitucional; o processo da sua consolidação, porém, viria a ser difícil e demorado. Contudo, a temeridade das suas propostas foi de certa maneira o impulso para uma reacções mais exacerbada das facções conservadoras da sociedade portuguesa, que logo viriam a pôr fim à sua vigência.

Com efeito, a Constituição de 1822 esteve vigente durante apenas dois efémeros períodos: um primeiro período entre 23 de Setembro de 1822, altura em que foi aprovada, e 3 de Junho de 1823, ocasião em que D. João VI a suspendeu por ocasião da Vilafrancada, com a promessa não cumprida de a substituir por outra; um segundo período entre 10 de Setembro de 1836, quando ocorreu a Revolução de Setembro, e 20 de Março de 1838, momento em que foi aprovada a nova Constituição de 1838. De facto, foram dois dos períodos mais fecundos em termos de produção legislativa destinada a acabar com o Portugal Velho a que se referiram, entre outros, Alexandre Herculano ou Oliveira Martins.

Apesar de tudo, a Constituição de 1822 fica no entanto como um marco fundamental para a História da democracia em Portugal, e qualquer estudo sobre o constitucionalismo terá que a ter como referência nuclear.

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